Decorria a época 1998-99 e um dos nossos observadores regressa de uma das suas digressões com a informação: «Vi um George Weah com 16 anos, é angolano e pode vir a Barcelona para um período de observação». Van Gaal, apaixonado por Kanu, Babangida, Kluivert e companhia, chegados ao Ajax de forma similar, anuiu.

Passadas algumas semanas chega o Pedro, curiosamente num período de compromissos internacionais que devastavam o nosso plantel e nos deixavam reduzidos a uma dezena de jogadores.

O jovem Pedro Mantorras, que se destinava à equipa «B», foi assim, durante um par de dias, integrado nas nossas sessões. Acredito que o choque de realidades foi abrupto; estar em Luanda num dia e no dia seguinte estar com «as estrelas de Hollywood» será certamente uma sensação que só ele poderá descrever e daí as dificuldades encontradas para exteriorizar o potencial que consigo viajou. Sensibilizado pela inocência e solidão, influenciado pelo sentimento que nos continua a unir aos africanos de expressão portuguesa, preocupei-me.

Recordo-me que o levei ao armazém da marca desportiva com quem tinha contrato e o enchemos de material para que pudesse fazer face ao inverno catalão. Recordo a expressão facial de um rapaz simples mas ainda perdido. As dificuldades de comunicação e de afirmação eram inequívocas.

Regressam as estrelas maiores dos seus jogos de selecção e Pedro passa a integrar os trabalhos da equipa «B». Ronald Koeman, o treinador, gostou mas tinha dúvidas e solicitou o alargamento do período experimental. Pedro Mantorras tinha compromissos em Angola e o seu clube exigia o regresso. Nunca mais o vi.

Com o meu regresso ao futebol português, o reencontro. Mais forte, mais potente, mais rápido, tecnicamente mais elaborado, tacticamente mais inserido no «habitat» de jogo. Parabéns a Jesualdo Ferreira, parabéns a Mariano Barreto. Parabéns a José Couceiro, que soube escolher uma equipa técnica com argumentos formativos e capaz de proporcionar «maturações consubstanciadas».

Hoje, Mantorras é um homem confiante. Deseja jogar contra os grandes, desafia jogadores de alto nível, assume o seu poderio e ambições, destrói os adversários, ganha. O menino que chegou a Barcelona envergonhado e assustado é hoje um jogador «arrogante» e reclama estar entre os melhores. Continua, Pedro.